domingo, 16 de novembro de 2008

As coisas importantes: As castanhas e as Bandeiras

Sei que já passou o tempo: dia 11/11 já foi. Mas vale sempre a pena falar sobre ele.
Não sei se tem a ver com a repetição dos números, mas coisas realmente especiais aconteceram nesse dia. Também na minha vida.
Em primeiro lugar, se não fosse 11 /11/1975, talvez eu nem existisse... mas por vezes gosto de pensar que fui fruto de uma Revolução.

Antes disso, o meu pai (na altura em que ainda não era meu pai), escondia livros e coisas proibidas em lugares mais ou menos escondidos, e a minha mãe, andava a passear no kimbo com bandeiras. Ambos ficaram depois de 1975, por acrediraem que havia um futuro para a sua terra.

11/11/1975 é a data da independência de Angola. É uma data que sempre desconsegui (fui angolana o suficiente), de perceber. Mas então, a independência já não tinha sido? Eu sei que tudo tem a ver com quem içou a bandeira mais alto, com quem resistiu mais, com quem prevaleceu. Não é arrepiante, ver a nossa bandeira a subir?

Eu consigo imaginar o cenário... não o conseguirei nunca viver, porque nasci 16 meses mais tarde, quando a estação das chuvas já começava a morrer.

Mas sempre que penso nisso, penso na figura de Agostinho Neto.

Segundo a minha mãe, não se podia sair de casa nesse dia, por causa dos tiros...

Sem olhar para o lado histórico, também gosto desta data porque me lembra o S. Martinho e as minhas adoradas castanhas assadas com um bocadinho de manteiga, como a minha avó me ensinou.

Quando era pequena, a minha avó fazia-me castanhas e ficava a ver-me comer. Eu adoro castanhas... ficava sempre com a barriga a doer, mas tão contente.

Há todo um conjunto de memórias que me conduzem a esta data que realmente concluo que deve ser mesmo importante na minha vida.

Felizmente aqui é feriado, mas na rua não cheira a castanha assada.


Que saudades

sábado, 8 de novembro de 2008

É um Espectáculo, sim sr!

Às vezes o impensável acontece e lá fui eu, avessa aos meus princípios anti-futebolísticos, mas aliada a uma causa muito maior que essa e que requeria a minha presença. Pois é fui jogar Futebol!
E mais: ganhámos 4-2!


E aqui fica mais um cheirinho do amigo Sérgio sobre este assunto.

Quando
tu me vires no futebol
estarei no campo
cabeça ao sol
a avançar pé ante pé
para uma bola que está
à espera dum pontapé
à espera dum penalty
que eu vou transformar para ti

eu vou atirar para ganhar
vou rematar
e o golo que eu fizer
ficará sempre na rede
a libertar-nos da sede

não me olhes só da bancada lateral
desce-me essa escada
e vem deitar-te na grama
vem falar comigo
como gente que se ama
e até não se poder
mais vamos jogar

Quando
tu me vires no music-hall
estarei no palco
cabeça ao sol
ao sol da noite das luzes
à espera dum outro sol
e que os teus olhos os uses
como quem usa um farol

não me olhes só dessa frisa lateral
desce pela cortina e acompanha-me em cena
vamos dar à perna
como gente que se ama
e até não se poder mais
vamos bailar

Quando
tu me vires na televisão
estarei no écran
pés assentes no chão
a fazer publicidade
mas desta vez da verdade
mas desta vez da alegria
de duas mãos agarradas
mão a mão no dia a dia

não me olhes só desse maple estofado
desce pela antena e vem comigo ao programa
vem falar à gente
como gente que se ama
e até não se poder mais
vamos cantar

E quando
à minha casa fores dar
vem devagar
e apaga-me a luz
que a luz destoutra ribalta
às vezes não me seduz
às vezes não me faz falta
às vezes não me seduz
às vezes não me faz falta

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Próxima estacion: Malanje

Dando seguimento à rubrica Próxima estacion, desta vez rumei em direcção a Malanje.
Malanje é uma província e situa-se na região centro Norte de Angola. Com 2.422 km² e que oferece inúmeras possibilidades para um fim-de-semana prolongado, para esquecer que os dias da semana existem, para sair do nosos buraco que se torna por vezes a desculpa da rotina.
O inicio da viagem estava agendado para as 5:00, para quem saía do Huambo. Para quem sai de Luanda um pouco mais tarde. O primeiro objectivo era reunir a equipa completa no Alto Dondo, para depois ir em direcção a Malanje.
O trajecto é simples: Huambo-Alto Hama- Wako Kungo (para abastecer)- Quibala – Alto Dondo- N’Dalatando e por fim Malanje, completando assim cerca de 750 km de trajecto.
Cumprindo o bom rigor português as tropas reuniram-se por volta das 5:00 nas bombas de gasolina do Kapango. Depois de 10 minutos a tentar que me servissem 5 cafés lá consegui. O certo é que eram 6:00 quando deixamos as bombas, estava-se tão bem…



O que dizer da paisagem? Não se consegue falar, porque ela se entranha em nós e vai ocupando as nossa células. Depois tudo em nós é terra vermelha, terra verdejante e espaço aberto.



Vamos entrando pela paisagem, passando por várias localidades que nos agradecem a passagem: é a hospitalidade Angolana.
Chegados ao Alto Dondo mudamos de direcção rumo a Leste.
Passamos por N’Dalatando (que nos tempos de antigamente se chamava Salazar) que é uma cidade ainda muito degradada. Vá-se lá saber se foi o nome que vaticinou triste sina…
Depois, ao chegar ao Cacuso, começam-se a avistar as pedras Negras de Pungo Angondo, que ficam a 35 km de distância, mas que se avistam de uma forma assombrosa na paisagem. O ar fica suspenso…e é só com o olhar que percorremos o horizonte. Passámos ao lado, andámos mais uns km e virámos para Kalandula, por meio de campos completamente minados, que impedem o desenvolvimento da região.
Quantas minas há ainda por desbravar? Quantas já foram activadas por quem apenas passava no caminho para casa? Esses cidadãos têm um nome: cidadão X. São milhares…
Algures a meio do caminho começa-se a vislumbrar as quedas de água de Kalandula, que são as segundas maiores de África. Tempo para tirar umas fotos.
Finalmente chegamos ao Hotel Yolaka, um paraíso no meio de uma vila que é praticamente escombros.
(O descanso dos guerreiros)

Mas nem tudo corre bem… entre a piscina vazia e a possibilidade de dois verdadeiros machos terem que partilhar uma cama de casal, que mais se podia pedir? Apenas que não chovesse. Isso é impossível… a chuva cai aqui com quase tanta intensidade como no Huambo. É bom ouvi-la enroscada na cama.
A noite foi animada, com uma jogatina de poker… mas são sempre os mesmos a ganhar!

(Há que telefonar para casa...)

A noite foi de repouso absoluto! Que bom, dormir ao som da chuva e da trovoada e saber que elas estão lá fora.
O dia 2 foi de deslumbre. Chegámos às quedas de água de Kalandula! São de facto impressionantes pela sua extensão, beleza, força e todo o poder que emana da força da água a cair durante 105 m de altura!

Daqui partimos para as quedas de água de Musselege, bonitas também, mas macias, comparativamente com as de Kalandula.
Aqui reina a paz e o canto dos pássaros que entoa em todos os pontos cardeais.
Não foi possível o tão ansiado mergulho. As águas estavam muito turvas e a presença de uma cobra de 1,5 m em decomposição numa rocha atemorizou os mais audazes.
São as vicissitudes da vida.

De seguida a direcção é Malanje. Dá bastante tempo para dormir mais um bocado dentro do carro.


Malanje surpreende pela positiva: bonita, arranjada, recuperada e com uma esplanada para beber umas cucas.
Infelizmente também no Hotel Palanca Negra a piscina estava vazia…
Regresso ao nosso canto, em Kalandula para mais uma jogatina de poker. Amanhã é dia de ir às compras!
Dia último: destino pedras negras de Pungo Andongo, mas por aquela picada que estava muito má! Essa mesma.
(a verdadeira picada)
É África em todo o lado… floresta por toda a parte, kimbos abandonados à memória dos poucos que por aqui se aventuram, crianças que acenam à nossa passagem e rios que atravessam a picada.
A conversa vai animada: sobre escolhas da vida. Nem todos escolhemos os mesmos caminhos, nem todos temos as mesmas opções.
De Cacuso viramos para Pungo Andongo: ali estavam elas à nossa espera, hoje como há milhões de anos. Vistas de uma forma que mais ninguém antes viu, que é a nossa própria maneira de olhar as coisas.
Subimos ao cimo de uma delas: dizia alguém isto é burgau! Não vêem que é calhau rolado. Incrível, mas parece que a água andou mesmo lá por cima e durante muito tempo.

Depois descemos e fomos ver a “pata” da Rainha Ginga, que por ali passou enquanto fugia dos portugueses. Já há 400 anos atrás havia alguém a dizer Não e a resistir para lembrar que a terra afinal tinha dono.
A vontade era pouca mas tivemos que abalar. Já eram 15:00 e ainda nos faltavam 700 km para chegar a casa, vulgarmente conhecida como Huambo e para o Alexandre, em particular, Luanda.
Graças ao GPS, esse aparelho moderno que nos diz onde estamos no meio do mato, apanhámos uma estrada “alternativa”, a corta-mato, para chegarmos mais cedo ao Dondo. E infalivelmente lá estávamos nós.
Aqui dividimo-nos novamente, para aquilo que foi a pior parte da viagem: 5 pessoas numa BT 50, carregada de gente e de malas.
Cheguei ao Huambo às 22:00, mas com vontade de nunca ter partido de Kalandula e ter ficado enroscadinha a ouvir a chuva e a trovoada.