sábado, 21 de março de 2020

Amor nos tempos do Corona

O título é bastante óbvio e até gasto, diriam muitos de vós, mas não me ocorre melhor para descrever os tempos que vivemos.
Não acredito que seja o amor que nos vá salvar desta catástrofe, mas sim a ciência. Não haverá alinhamento de xakras, ou rezas e mezinhas tradicionais que resolvam o problema. Seria mais fácil acreditar que sim. 
Nunca pensei viver um cenário tão apocalíptico e descabido, não estava preparada. Mesmo com a ameaça das alterações climáticas, com resultados tão devastadores e já aí à porta, sempre fui empurrando com a barriga e pensando que a Humanidade encontraria a sua ordem.
Em meados de Janeiro começámos a ouvir falar do novo Corona Virus, uma epidemia que se alastrava na China e países limítrofes, mas contudo longe daqui. Depois, foi chegando mais próximo e no final de Janeiro começamos a contar os casos na Europa. Agora damos-lhe um nome próprio, porque a sua impostância é merecedora de tal: é o Covid-19. Os números foram-se amontoando, enquanto em Portugal continuavamos à espera, como a nêspera que algo acontecesse.
Entretanto em Itália a epidemia alastra-se e os números e mortos acumulam-se. 
Começamos a reflectir e a perceber que agora a pandemia estava demasiado próxima, e eis que, sem apelo nem agaravo, depois do Carnaval começam a aparacer em grande escala os casos suspeitos em Portugal, quase todos importados de Itália. O medo começa a interiorizar-se e a fazer parte da nossa rotina: será que conheço alguém que tenha ido a Itália? Será que estive nalgum local onde esteve um infectado, será que é seguro as crianças voltarem à escola depois da pausa, quando há tantos alunos que viajaram para países onde há casos confirmados? As perguntas acumulavam-se e sem uma resposta sensata à vista.
Nos dias que antecederam o início das aulas, que ocorreu 09 de Março, começo a receber notificações em catadupa sobre em grupos das redes sociais sobre os primeiros casos de Covid-19 e sobre a razoabilidade de a escola reabrir. Nós optámos por tentar manter uma rotina normal, mas observando a evolução do que se estava a passar. Não obstante a tentativa de manter a normalidade, abandonámos a realização de actividade física em espaços fechados e decidimos que a Catarina não iria à natação. Todas as saídas a cafés seriam as estritamente necessárias, a partir de agora.
Na escola, os número de crianças ausentes aumentava de dia para dia, enquanto aguardávamos expectantes alguma informação sobre a continuidades das aulas. A escola mantinha-se vigilante mas respeitando as decisões da OMS, DGS e da embaixada de França em Portugal. No fundo, ansiavamos que fechasse.
Nas notícias víamos: universidades a fechar (uma a uma), unidades de entretenimento a cancelarem actividades, cinemas a fecharem, enquanto enviávamos calmamento os nossos filhos para a escola. Já não podiamos ignorar que algo se passava, bem perto de nós. O que me parecia mais surreal era que as decisões estavam a ser tomadas unilateralmente, sem concertação, mas todas no mesmo sentido.
Entre nós a ansiedade foi aumentando, comprimindo o meu coração de mãe, até que decidimos que não voltariam à escola no dia seguinte. Isto porque um colega da minha filha tinha estado em Floresça nas férias. Aí senti o pânico a apertar-me o estômago e na Sexta-feira, dia 13/03, iniciámos o isolamento social voluntário, e permanecemos vigilantes em relação ao avanço da doença. Nesse mesmo dia, o Governo declara o Estado de Alerta, preconizando o encerramento de todas as escolas e estabelecimentos de ensino a partir de dia 16/03. Estamos oficialmente preocupados e aterrorizados com o que se ouve de Itália e mais concretamente de Itália.
Começámos aí a fazer planos para o que prevíamos que poderia acontecer, mas não ao ponto de ir a correr comprar papel-higienico. Por isso fiquei chocada quando numa primeira tentativa de comprar papel-higienico online, recebiamos mensagens de que artio estava esgotado. Porquê papel-higiénico? Porque não sabão para lavar as mãos.
As compras online que tinhamos feito a meio da semana, estavam confirmadas (incluindo o belo do papel-higienico e o atum em lata) e iríamos buscá-las na segunda feira, dia 16. Entretanto reforçámos a despensa, um bocadinho mais que o habitual, mas muito menos que uma família normal de 5 pessoas. Somos apologistas de minimizar o desperdício e comprar unicamente o que precisamos, mas atendendo à excepcionalidade do momento comprámos mais carne e peixe, vegetais e pão, considerando que as compras grandes estavam feitas.
Talvez nos achem loucos, mas embora tenhamos decidido fazer isolamento social voluntário, fomos passar um fim-de-semana há muito marcado na Régua.
Deixámos as crianças com a minha mãe e a minha tia e partimos.
O cenário que encontrámos foi desolador. Embora o hotel estivesse ainda bem composto na sexta-feira, não havia gente na rua nem nos restaurantes. Jantámos sozinhos, num restaurante só para nós, mas doía-me o desalento do jovem dono e dos funcionários. Aqui tive um primeiro vislumbre do que poderia estar para vir.
Já no hotel, muita gente a desmarcar e muitas de prevenção implementadas, para dar cobro às instruções da DGS.
Depois de voltarmos, fechamo-nos em casa à espera do pior. Ainda não sabemos o que será, mas sinto um nervoso miudinho em crescendo.
Como será o amanhã? É sempre a pergunta que deixámos para ser respondida no dia seguinte.

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