Não acredito que seja o amor que nos vá salvar desta catástrofe, mas sim a ciência. Não haverá alinhamento de xakras, ou rezas e mezinhas tradicionais que resolvam o problema. Seria mais fácil acreditar que sim.
Nunca pensei viver um cenário
tão apocalíptico e descabido, não estava preparada. Mesmo com a ameaça das
alterações climáticas, com resultados tão devastadores e já aí à porta, sempre
fui empurrando com a barriga e pensando que a Humanidade encontraria a sua
ordem.
Em meados de Janeiro começámos
a ouvir falar do novo Corona Virus, uma epidemia que se alastrava na China e
países limítrofes, mas contudo longe daqui. Depois, foi chegando mais próximo e
no final de Janeiro começamos a contar os casos na Europa. Agora damos-lhe um
nome próprio, porque a sua impostância é merecedora de tal: é o Covid-19. Os
números foram-se amontoando, enquanto em Portugal continuavamos à espera, como
a nêspera que algo acontecesse.
Entretanto em Itália a epidemia
alastra-se e os números e mortos acumulam-se.
Começamos a reflectir e a perceber
que agora a pandemia estava demasiado próxima, e eis que, sem apelo nem
agaravo, depois do Carnaval começam a aparacer em grande escala os casos
suspeitos em Portugal, quase todos importados de Itália. O medo começa a
interiorizar-se e a fazer parte da nossa rotina: será que conheço alguém que
tenha ido a Itália? Será que estive nalgum local onde esteve um infectado, será
que é seguro as crianças voltarem à escola depois da pausa, quando há tantos
alunos que viajaram para países onde há casos confirmados? As perguntas
acumulavam-se e sem uma resposta sensata à vista.
Nos dias que antecederam o
início das aulas, que ocorreu 09 de Março, começo a receber notificações em
catadupa sobre em grupos das redes sociais sobre os primeiros casos de Covid-19
e sobre a razoabilidade de a escola reabrir. Nós optámos por tentar manter uma
rotina normal, mas observando a evolução do que se estava a passar. Não
obstante a tentativa de manter a normalidade, abandonámos a realização de
actividade física em espaços fechados e decidimos que a Catarina não iria à
natação. Todas as saídas a cafés seriam as estritamente necessárias, a partir
de agora.
Na escola, os número de
crianças ausentes aumentava de dia para dia, enquanto aguardávamos expectantes
alguma informação sobre a continuidades das aulas. A escola mantinha-se
vigilante mas respeitando as decisões da OMS, DGS e da embaixada de França em
Portugal. No fundo, ansiavamos que fechasse.
Nas notícias víamos:
universidades a fechar (uma a uma), unidades de entretenimento a cancelarem
actividades, cinemas a fecharem, enquanto enviávamos calmamento os nossos
filhos para a escola. Já não podiamos ignorar que algo se passava, bem perto de
nós. O que me parecia mais surreal era que as decisões estavam a ser tomadas
unilateralmente, sem concertação, mas todas no mesmo sentido.
Entre nós a ansiedade foi
aumentando, comprimindo o meu coração de mãe, até que decidimos que não
voltariam à escola no dia seguinte. Isto porque um colega da minha filha tinha
estado em Floresça nas férias. Aí senti o pânico a apertar-me o estômago e na Sexta-feira,
dia 13/03, iniciámos o isolamento social voluntário, e permanecemos vigilantes
em relação ao avanço da doença. Nesse mesmo dia, o Governo declara o Estado de
Alerta, preconizando o encerramento de todas as escolas e estabelecimentos de
ensino a partir de dia 16/03. Estamos oficialmente preocupados e aterrorizados
com o que se ouve de Itália e mais concretamente de Itália.
Começámos aí a fazer planos
para o que prevíamos que poderia acontecer, mas não ao ponto de ir a correr
comprar papel-higienico. Por isso fiquei chocada quando numa primeira tentativa
de comprar papel-higienico online, recebiamos mensagens de que artio estava
esgotado. Porquê papel-higiénico? Porque não sabão para lavar as mãos.
As compras online que tinhamos
feito a meio da semana, estavam confirmadas (incluindo o belo do
papel-higienico e o atum em lata) e iríamos buscá-las na segunda feira, dia 16.
Entretanto reforçámos a despensa, um bocadinho mais que o habitual, mas muito
menos que uma família normal de 5 pessoas. Somos apologistas de minimizar o
desperdício e comprar unicamente o que precisamos, mas atendendo à
excepcionalidade do momento comprámos mais carne e peixe, vegetais e pão,
considerando que as compras grandes estavam feitas.
Talvez nos achem loucos, mas embora
tenhamos decidido fazer isolamento social voluntário, fomos passar um
fim-de-semana há muito marcado na Régua.
Deixámos as crianças com a
minha mãe e a minha tia e partimos.
O cenário que encontrámos foi
desolador. Embora o hotel estivesse ainda bem composto na sexta-feira, não
havia gente na rua nem nos restaurantes. Jantámos sozinhos, num restaurante só
para nós, mas doía-me o desalento do jovem dono e dos funcionários. Aqui tive um
primeiro vislumbre do que poderia estar para vir.
Já no hotel, muita gente a
desmarcar e muitas de prevenção implementadas, para dar cobro às instruções da
DGS.
Depois de voltarmos,
fechamo-nos em casa à espera do pior. Ainda não sabemos o que será, mas sinto
um nervoso miudinho em crescendo.
Como será o amanhã? É sempre a pergunta que deixámos para ser
respondida no dia seguinte.
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